“Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver do Universo… Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer, porque eu sou do tamanho do que vejo e não do tamanho da minha altura…” Alberto Caeiro
Nas cidades a vida é mais pequena que aqui na minha casa no cimo deste outeiro. Na cidade as grandes casas fecham a vista à chave, escondem o horizonte, empurram o nosso olhar para longe de todo o céu, tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os nossos olhos nos podem dar, e tornam-nos pobres porque a nossa única riqueza é ver.
É assim que Fernando Pessoa, através de Alberto Caeiro, contrapõe o sossego da aldeia com a agitação da cidade, no sétimo poema d’O Guardador de Rebanhos. Nesta obra, composta por 49 poemas, um pastor expressa a sua filosofia de vida, que é centrada na simplicidade, na observação directa da natureza e na rejeição do pensamento excessivo.
Embora cada poema possa ser único na sua expressão linguística e enredo, todos eles compartilham a ênfase na relação do poeta com a natureza e com o prazer extraído das coisas simples. Esses poemas exploram frequentemente a frugalidade da vida pastoral, a conexão profunda com a natureza, a rejeição da racionalidade desnecessária e a valorização das sensações como uma fonte de verdade, de paz e de sabedoria.
São poemas que celebram a capacidade de ver as coisas como elas são, sem a necessidade de as interpretar, ponderar ou analisar pormenorizadamente. Expressam a ideia de que a natureza é a única/verdadeira filosofia, e que também por isso, devemos aprender com ela, em vez de nos perdermos em teorias e pensamentos abstractos. Caeiro destaca a importância de viver o presente e apreciar a simplicidade da existência, nossa, dos outros e do mundo natural.
Como costuma acontecer com os grandes géneros literários, Pessoa tem a mania de se querer manter colado à contemporaneidade. O Guardador de Rebanhos, escrito há quase um século, podia muito bem descrever, na actualidade, a dicotomia aldeia-cidade. Hoje, mais do que nunca, até mais do que na altura de Pessoa, as pessoas estão conscientes dos benefícios de desacelerar, de emergir no que é natural e de apreciar os momentos tranquilos.
Muitas estão a adoptar práticas como o mindfulness, a meditação, ou o reiki, para as ajudarem a reconectar com algumas sensações mais primitivas/genuínas e a experimentarem o presente de forma mais plena, sem a ponderação das cicatrizes do passado ou preocupações com as nuvens sombrias do futuro. Isso significa fazerem off da constante agitação digital e on no sentir a brisa no rosto, no cheiro da terra molhada após a chuva ou no calor comedido trazido pelos raios do pôr-do-sol.
A natureza desempenha um papel determinante nessa busca pela simplicidade, pela conexão com o descomplicado, pelo mergulho no despreocupado. Em consequência disso, as pessoas estão a (re)descobir o prazer de caminhar em trilhos, jantar sob a luz das estrelas, ou simplesmente abrandar o relógio numa leitura à beira de uma queda de água pitoresca.
Esse banho natural permite uma pausa nas preocupações quotidianas e proporciona uma sensação de harmonia que muitas vezes falta nos ambientes urbanos mais agitados. Para além dessa imersão, é necessário também acalmar o ritmo das nossas sinapses, ou pelo menos tentar que elas não ocorram sempre pelos mesmo motivos.
A rejeição do pensamento excessivo, ligado ao trabalho, ao estudo ou às preocupações do dia a dia, é um desafio, mas também é uma meta alcançável. Basta cultivar momentos de silêncio, onde podemos (simplesmente) estar presentes, sem distracções, compromissos ou obrigações.
A meditação e a prática da atenção plena são ferramentas valiosas para acalmar a mente e reduzir o stress que frequentemente acompanha a agitação moderna. A respeito disso, tenho de vos falar do livro que acabei ontem de ler, Dentro da Loja Mágica de James R. Doty. Nele um neurocirurgião, prova-nos que esse relaxamento é determinante para o nosso sucesso, bem-estar e saúde, mas isso fica para depois.
Outra dimensão de Caeiro tem a ver com o valorizar as sensações como uma fonte de verdade e sabedoria. A simplicidade do aroma de um ramo de árvore acabado de ser cortado, a complexidade das cores de um pôr do sol ou o calor reconfortante de uma lareira podem oferecer insights e prazer profundos, se nos permitirmos passar por essas experiências em plena consciência.
Hoje, falo-vos de um hotel que procura corresponder a essa filosofia de Caeiro sem desleixar o conforto, o bem-estar e alguma modernidade que não larga a mão da autenticidade. Se esta ligação vos parece demasiado forçada, passo então a explicar os motivos que puxaram para Caeiro aquando da visita ao Casas da Lapa – Nature & SPA Hotel 😉
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