“O silêncio é uma confissão… é o desafogo das grandes emoções, que abafam o espírito, enturvando-nos a razão.” Camilo Castelo Branco
“No princípio, quando Deus criou o céu e a terra, a Terra estava sem forma e sem ordem. Era um mar profundo coberto de escuridão; mas sobre as águas pairava o Espírito de Deus. Então Deus disse: «Que haja luz!» E a luz começou a existir. Deus achou que a luz era uma coisa boa e separou-a da escuridão. E Deus chamou à luz dia e à escuridão, noite. Passou uma tarde e veio a manhã: o dia um.”
Génesis 1:1-5: Assim começa o livro mais vendido de todos os tempos, assim começa a Bíblia. Bem antes, no século VIII a.C., já Zaratustra, profeta e poeta nascido na Pérsia e o fundador do Masdeísmo/Zoroastrismo (religião adoptada oficialmente pelo Império Aqueménida e que muito provavelmente foi a primeira religião monoteísta ética da história), articulava as noções de céu e inferno, julgamento após a morte e livre-arbítrio. A quem rezava Zaratustra? A Ahura-Mazda, o deus da Luz.
Viajando um pouco mais para trás na história, na mitologia egípcia, todas as formas de vida foram criadas pelo Deus Rá, ao pronunciar os seus nomes secretos. Rá era também conhecido como “Pai dos deuses” e “Pai dos homens”.
Isto porque, para os egípcios, Rá era a divindade mais importante, e acreditava-se que para além de ser o criador da vida era também o criador do mundo, dos deuses e da humanidade. Era considerado o protector do Egipto e ficou na história como o Deus Sol.
Fugindo um pouco da religião, no início da medicina, o seu pai, Hipócrates (século V a.C.), exercia em Cos, nos templos de Esculapius – filho de Phcebus Apollo (deus do Sol, da medicina e da música), uma espécie de cura potenciada através da acção da luz solar.
Postulou que se tivéssemos uma cidade bem orientada para o sol, nela não existiriam tantas pragas e doenças devido a uma “imunidade solar”. Já no início de nossa era (século II), Galeno e Celso, considerados os pais da farmácia, comprovaram o efeito da luz solar na anatomia, na fisiologia, na patologia, na sintomatologia e na terapêutica.
Na Idade das Trevas (século III), paradoxalmente, surge uma espécie de culto ao Sol Invicto. Por esta altura, o astro rei, além de se assumir como o maior adversário, simbólico, das trevas, surge também intimamente ligado à sabedoria. Uma sabedoria gigante, quase divina, muito maior que a soma aritmética do conhecimento de todos os humanos.
É o sol que no código de Hammurabi (já vos falei dele anteriormente) dá as leis aos monarcas, para que eles possam de forma generosa governar os seus súbditos. É esta imagem de luz divina que os maiores imperadores romanos vão tentar capitalizar como arma política: são eles o elo de ligação entre os humanos e esse universo de divindade, de sabedoria e de luz.
Neste sentido, a 7 de Março do ano 32, o imperador Constantino proclama o domingo como dia de descanso, com o objectivo de organizar o calendário semanal. Este passa a ser o dia do deus Sol, divindade oficial do império romano nessa altura, e que explica a designação utilizada pelas línguas germânicas para este dia (dia do sol: Sunday).
“Que no venerável Dia do Sol, os magistrados e os que residem nas cidades descansem, e que todas as oficinas estejam fechadas. Porém, nos campos, os que se ocupam da agricultura poderão livremente continuar seus afazeres, pois pode ocorrer que outro dia não seja tão conveniente para as sementeiras ou a plantação de vinhas”, legislava Constantino. Voltaremos às vinhas mais tarde… 😛
Todas estas crenças antigas (religiosas, pagãs ou ateístas), receberam uma validação científica no início do século XX, quando a luz solar foi usada para matar bactérias da tuberculose e tratar o raquitismo. Inspirados pelos defensores do sol como meio curador, a enfermeira inglesa Florence Nightingale é um dos seus nomes mais proeminentes, hospitais e sanatórios foram projectados com grandes janelas voltadas para o leste e clarabóias para maximizar a exposição solar de seus pacientes.
Durante a gripe espanhola de 1918-1919, os pacientes que foram tratados em hospitais mais lotados e que eram regularmente levados ao sol tiveram taxas de mortalidade bem mais baixas do que aqueles que foram deixados em ambientes mais restritos e mais afastados do sol.
Todo este entusiasmo pela luz solar como “remédio” diminuiu depois dos antibióticos começarem a ser amplamente utilizados na década de 1930, mas ressurgiu recentemente, à medida que aumentavam as evidências do papel (muito complexo) da vitamina D, por vezes chamada de vitamina do sol, desempenhado na biologia humana.
Embora os mecanismos por detrás da sua acção ainda não sejam totalmente compreendidos, um estudo publicado em 2019 pelo Dr. Holick e colegas comprovou que a vitamina D aumentava a expressão de centenas de genes que ajudavam a regular a função imunológica.
Esse estudo mostrou ainda que a actividade física sob luz solar ajudava as pessoas a manter o peso adequado, reduzia o risco de diabetes e doenças cardíacas, beneficiava a saúde óssea, reduzia o stress e melhorava o bem-estar emocional. Para além de tudo isso, a exposição solar permitia também que a pele criasse óxido nítrico, que reduzia a pressão sanguínea e melhorava a saúde cardiovascular.
Até contra o famigerado COVID-19 a luz solar parece oferecer mais valias. Paul Dabisch, um especialista em aerobiologia do Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos da América, juntamente com outros especialistas, publicou um artigo em Novembro de 2019 que reportou o facto experimental da COVID-19 ser rapidamente inactivada quando exposta à radiação ultravioleta proveniente da luz solar.
Assim, muitos cientistas já se referem à luz solar como a bala mágica que nos conduz à saúde, ao bom humor, à boa disposição e a um bem estar geral. A luz solar é também muito importante para a vinha e para os vinhos. Sem luz solar, as plantas não conseguem fotossintetizar, atrofiam e morrem.
Para além disso, a luz do sol é um dos factores mais importantes no desenvolvimento das uvas com a quantidade certa de glicose, compostos fenólicos e moléculas que conferem sabor aos vinhos. De forma simplista, mais luz solar corresponde a mais e melhor sabor.
O sol é também muito importante para equilibrar os níveis certos de luz solar com os “efeitos de arrefecimento” úteis, como a neblina e brisas matinais, de modo a garantir que as uvas mantenham a sua acidez enquanto desenvolvem características maduras e frutadas. É essa acidez que mantém a estrutura das uvas e evita que elas se tornem muito frutadas ou até exageradamente doces.
É por tudo isto, que tal como acontece com os imóveis, as vinhas que ficam na direcção certa em relação ao sol, são as mais desejadas e também as mais caras, isto porque, normalmente, essas vinhas produzem uvas com mais sabores.
Para além de todos estes aspectos mais objectivos/científicos ligados à bonita relação entre luz solar, saúde, boa disposição, vinha e vinho, existem outros mais subjectivos, como a conjugação, quase mágica, entre uma luz muito especial, gastronomia, enoturismo, vinha e paz, que encontrei no Casa das Pipas Hotel, da Quinta do Portal. É sobre ela que vos quero falar hoje.
Mal abri a janela do nosso quarto que conduzia a uma varanda com uma vista panorâmica sobre a vinha (onde tirei a foto à Clarisse que serve de “capa” a esta publicação), pensei instintivamente: “Pah, o tema da critica vai ter que ser esta luz!!!”. Até a Bia e o Gui, seres inquietos por natureza, ficaram abismados com a beleza daquele momento e ficaram sossegados (para quem os conhecem acrescento que juro que ficaram mesmo sossegados :P) à janela durante vários minutos a contemplar o espectáculo silencioso que a mãe natureza nos oferecia generosamente.
Mas a Casa das Pipas da Quinta do Portal tinha muito mais para mostrar. Emerge por entre as vinhas que se encontram à distância de um abraço, permitindo ainda vislumbrar o Douro montanhoso que recorta o horizonte, desafiando os céus. A oferta é completada com a Casa do Lagar também ela situada na Quinta do Portal, a 200 metros da Casa das Pipas, confinando harmoniosamente com a aldeia de Celeirós do Douro, e que resulta da recuperação de um lagar de azeite tradicional.
A Casa das Pipas dispõe de 12 quartos (3 de categoria superior e 9 standard) e a Casa do Lagar 4 quartos (2 quádruplos e 2 standard), oferecendo, todos eles, vistas sobre os socalcos de vinha centenária e para o Douro, num enquadramento paisagístico, literalmente, de cortar a respiração.
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