Uma Tasca que não é Tasca – Izakaya Porto

A experimentar

O Izakaya Japanese Cuisine tem um nome que não corresponde à sua alma. Mas tem uma alma que lhe cria uma identidade viciante e única na cidade. E que identidade! E que alma! E que vício!

Bem escondido e discreto na zona Oriental da cidade, onde tudo vai acontecer em breve, encontramos este pequeno Izakaya, fruto de um sonho de dois amigos que nasceram nessa mesma rua e que faziam de baliza a porta da garagem mesmo em frente. Regressaram à base com este projeto absolutamente imperdível na cidade do Porto. 

A título de curiosidade, a Rua Barão de São Cosme tem o único alojamento local da cidade que só acolhe turistas de nacionalidade Japonesa. E esta, hein?

Izakaya significa “pub / tasca Japonesa”, mas como não fiquei satisfeito, resolvi perguntar à minha amiga Yuka Kobayachi (@tokyo_yuka_cafeliving), o que é para um japonês um Izakaya, qual o conceito e qual a identidade gastronómica. A resposta foi: “É um bar / pub informal, para uma bebida ao final do dia, onde também servem comida como espetadas grelhadas de frango ou peixe, sashimi, bifes variados e até fondue de queijo. Alguns têm salas privadas e mesas baixas, outros as mesas altas de pub inglês. Fecham normalmente às 23h00, mas o horário normal é entre as 18h00 e as 20h00)”.

Aqui a coisa não é atascada e gastronomicamente bem diferente. É um espaço de grande competência técnica, criatividade e algum requinte. São cerca de quatro mesas e mais quatro concorridos lugares ao balcão. Não há almoços e só há uma rodada por noite, isto é, 12 sortudos comensais por dia, nas mesas ou no balcão. 

Senhoras e senhores, segurem-se que o festim vai começar. 

Começamos com um akami (parte da carne vermelha do atum rabilho com menos gordura), servida numas bolinhas de alga ogo-nori desidratada e pérolas de gengibre. O sabor a mar é tão intenso que lembrei-me de um comentário que fiz na minha primeira visita ao Belcanto e provei o “Mergulho no Mar”, do chef Avilez – “acabei de dar um mergulho no meu mar de Ofir, passo as mãos pelo cabelo e deito-me na toalha para sentir nos meus lábios salgados este maravilhoso sabor a maresia”. Assim foi, mas deste vez sem estar em tronco nu, para gáudio dos presentes.  

Yuzu Pearls | Izakaya Japanese Cuisine Facebook

Seguimos com um salmão escocês (não sendo possível “o selvagem”, esta é das melhores proveniências) com miso fermentado durante três meses e licor de umeboshi (fervido primeiro para tirar o álcool e incorporado frio). Entre a doçura e o salgado, só apetecia embrulhar o salmão em tudo isto e esperar que aquele momento não terminasse nunca mais. Mas acabou. E, num excelente ritmo de serviço, chegou o usuzukuri (tipo de corte que permite apanhar as várias camadas da carne – pele, lombo e barriga) de robalo, com um viscoso e maravilhoso molho com manteiga de amendoim, quatro diferentes sementes de sésamo, com os seus óleos extraídos, e uns rebentos de ervilhas a dar frescura e amargor. Sabores a amendoim, cacau e café com uma textura perfeita, a parte sensorial em ebulição, esquecemo-nos até de quem está à nossa volta.  

Salmão & Miso | Izakaya Japanese Cuisine Facebook

Robalo & sésamo | Izakaya Japanese Cuisine Facebook

E, depois, ainda acertaram no meu peixe favorito que, diga-se de passagem, nunca tinha comido num restaurante japonês: salmonete. Vinha ligeiramente braseado, tinha amaranto a dar-lhe um toque terroso, alga desidratada, miso preto com dois anos de fermentação com cevada, dashi e kombu fumado, tudo a contrastar lindamente com o sabor a marisco do salmonete. Encimavam micro vegetais como a capuchinha, para dar ainda mais frescura. Oishi!, isto é, delicioso.

No round seguinte houve um fish fight entre sashimi de salmão e nigiri de atum e barriga de atum, com a particularidade de termos de um dos lados peixes com cura e maturação feitas na porta ao lado. A soja tinha igualmente dois anos e o gengibre fora cozido e preparado pelo chef Ruben. Quando a matéria prima é de primeira o resultado é de luxo. Assim foi.

Okonomiyaki (“okonomi” significa o que é que você quer ou pretende e “yaki” frito ou grelhado), a famosa panqueca ou omelete Japonesa, encontrada muitas vezes na forma de street food no Japão. Esta estava mais perto da omelete, cremosa, couve repolho (a dar o toque moderno à tradicional receita), a popular maionese japonesa Kewpie e o intenso katsuobushi (atum seco, fumado e fermentado) em movimentadas raspas. Eu sei que é uma heresia, mas se fosse eu, sem ninguém ver, colocava umas pedrinhas de sal por cima.

Quanto às sobremesas, sempre muito pouco açúcar, como em todos os doces japoneses. Tivemos um maravilhoso creme de matcha com bolo de mel da Madeira desidratado e crocante (em homenagem à mulher do chef) e um cheesecake japonês, que ficava entre um soufflé e um bolo Castella, o pão-de-ló japonês.

Na altura da minha primeira visita, no meu post do Instagram dizia assim: “Quando as pessoas se apaixonam têm aquele ímpeto de contar os minutos para voltarem a estar juntos. Ontem, aconteceu-me o mesmo. Conto os minutos para a próxima quinta-feira poder reconfirmar que, de longe, neste registo, o Izakaya é o melhor da cidade. Foi de tal forma que, num grupo de 10 amigos, tenho a certeza de que não fui boa companhia. A minha cabeça, ontem, estava noutro lado. Tal como quando as pessoas se apaixonam.

O serviço é de uma enorme informalidade, simpatia e competência, a carta de vinhos é pequena, mas criteriosa e bem pensada. Como tudo o resto. 

Tenho dito!


José Manuel Pires

Empresário

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