O Porto, e algumas terras do Minho, guardam nos seus restaurantes regionais um certo modo de ser que lhes fica bem e nos faz a nós, seus devotos peregrinos, sentir ainda melhor.
Falo da forma como se vestem – de mesas prazenteiras com toalhas de pano e “mis en place” bonito e acolhedor. Falo das gentes que nos acolhem e da sua irresistível simpatia. Falo ainda do ar que se respira, com aromas a sopa da casa e a outras fervências. E falo, principalmente, do lá que se come que nos chega à mesa fumegante nos grandes alguidares de barro.
A Cozinha do Martinho é uma dessas casas distintas que se nos insinua ali, quando a Costa Cabral quase se abraça na Areosa.
Pois bem, nada como tomar uma refeição em casas deste trapio com amigos velhos, alguns que não vemos há algum tempo e que se juntam assim aos afectos que a casa profusamente liberta. E assim foi há uns dias, num almoço aprazado para cedo que é quando se desfruta do melhor sossego destes aprazíveis momentos.
Uma das coisas que não devemos saltar neste tipo de restaurante é a sopa. De penca, nabiças, feijão ou o que for, oferecem um sabor a aconchego que nos conforta muito.
Depois, vêm os pecadilhos todos: Um prato de “muitas coisas” panadas a pedir casamento com o pão de trigo, denso, provavelmente feito na casa. Mais além, fatias de presunto de boa cura misturam-se com um queijo fininho do tipo Manchego que uma vez mais se acolitam na frescura do pão.
É hora de pedir a substância.
Esta é, como já perceberam, uma casa regional e numa casa destas não há que inventar – come-se o do dia pois claro, ou se assim não for opta-se por uma daquelas recorrências que não saem da lista porque os aficionados não deixam.
Por lá andam as tripas – que desvario de sabor, o cozido, a vitela ou a costela mendinha no forno, os rojões à nossa moda, e aquela infinidade de bacalhaus que só vindo Deus para escolher o que melhor nos serve.
Desta vez, os nossos olhos ficaram nos filetes de polvo com arroz do mesmo. Asseverados de que o arroz era enxuto, contratámos 2 doses para 5 almas esfomeadas. Tudo porque nos disseram que a dose tinha alguma largueza…
Passado o tempo devido aterraram na mesa duas exuberantes terrinas repletas de arroz coberto de reluzentes filetes de polvo.
Confirmamos a consistência do prato e a mesma indisfarçável pronúncia regional. Tínhamos falado à mesa da saudade do Aleixo e ali estava, todo pimpão, um competidor à altura dos mesmos pergaminhos.
No final, eu fui um dos dois agraciados com o que sobrou das 2 doses que os 5 não fomos capazes de debelar. Lembrei-me do milagre dos pães tal o tamanho daquilo que levei para casa!!
Sobremesa no mesmo tom, com a rabanada e o leite creme a destacarem-se numa carta sem outras surpresas.
Serviço diligente, profissional, à moda antiga que neste caso não é a pior!
Grande esta Cozinha do Martinho, o nome do santo e lendário soldado romano que fez do inverno verão e agora continua a fazer o milagre da nossa deslumbrante cozinha regional.
Restaurante A Cozinha do Martinho
Morada: Rua Costa Cabral 2598-2606
4200-219 Porto
Telefone: 22 496 1859
E-mail: brancapereira.cozinhadomartinho@gmail.com
Facebook: @cozinhadomartinho
Texto de António de Souza-Cardoso
O artigo foi originalmente publicado em Vida Económica.