O que une uma chef brilhante, um ex-piloto de F1 e uma atriz brasileira famosa?
São Paulo é uma cidade brilhante. Para comer e para beber. O serviço é geralmente perfeito e profissional, do boteco mais simples ao restaurante mais granfino do pedaço. Foi a minha décima visita e, desta vez, fiz um voo rasante de quatro dias apenas com intuitos gastronómicos. Não podia ter começado melhor.
Primeira impressão positiva: o mal de uns é o bem dos outros e, ao contrário do que acontecia no passado, o Brasil está barato para nós — real (mente).
O primeiro ataque foi a Helena Rizzo, uma pessoa com passado. Ex-modelo, eleita melhor chef mulher pela revista Restaurant em 2014, primeira estrela Michelin em 2015, é presença constante nos 50 melhores restaurantes da América do Sul, de acordo com o ranking do The World’s 50 Best Restaurants. Orgânico, biológico e sustentável é a onda. É nesta veste, aliás, que aparece a Fazenda da Toca, onde se junta ao sócio Pedro Paulo Diniz. Parece uma contradição, mas depois de terminar a sua carreira na F1, Pedro Paulo Diniz tem feito um notável trabalho em nome da sustentabilidade orgânica, regeneração agrícola e projetos de sustentabilidade social, como o Capitalismo Consciente. Já agora, ele é também o maior produtor de ovos biológicos da América do Sul.
O Mani, outro dos restaurantes do portfólio de Rizzo, é relaxado, tem boa energia e era um dos locais que mais desejava conhecer na cidade. Consegui. E então como é que é? É do caraças!
O Mani vale pela genialidade do pormenor. Jogo de provocação e sabor. Do amargo ao doce, do fumado ao cítrico e do ácido ao salgado, tudo no mesmo prato. Há sempre uma discreta ervinha que exalta os sabores, que alegra a alma e espevita os sentidos. Isto é alta cozinha, mesmo que discreta.
Começo por beliscar o bombom de queijo de cabra com cupuaçu torradas (fruto da amazónia da família do cacaueiro) e o bombom de foie gras com goiaba e Vinho do Porto. Crocante, macio, expressivo na boca.
Segue-se o nhoque de mandioquinha e araruta, com dashi de tucupi. A estrela da noite: derretia na boca e, de repente, sentíamos o salgado do dashi. Na novela “O Clone” (quando era mais novo, adorava uma boa novela) a actriz Mara Manzan dizia: “Cada mergulho é um flash”. Tal e qual neste prato.
O ceviche de caju com raspinhas de cajuína é um misto de um granizado cítrico e fresco, com o crocante do caju e o ceviche propriamente dito. Original e guloso.
O lámen (o mesmo que ramen) de lula com dashi de presunto, alho negro e ervilha-torta, por sua vez, mostra-se mais fechado e menos dialogante, com os amargos e os salgados do dashi. Dava que pensar, mas feita a introspecção, a conclusão é que só uma cabeça tecnicamente bem preparada e brilhante conseguiria imaginar este resultado.
Saravá para o polvo na brasa que parece manteiga na textura. E para o arroz de chouriço caramelizado, tostado e forte no tempero. Amei!
Para quem gosta de vegan, os ravioli (abertos?) com brandade de pupunha (fruto amarelo de uma palmeira existente, especialmente, no Pará e Amazonas), gema, cogumelos, confit de tomate e rúcula, são uma deliciosa opção.
Rita Lee cantava em “Lá vou eu”: “… Na cidade de São Paulo, o amor é imprevisível como você, e eu, e o céu…”
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